Caro(a) leitor(a), nessa área é apresentado a você como a Matemática é percebida sob a perspectiva da neurociência e, também, como a Matemática Financeira vem sendo trabalhada em sala de aula do Ensino Médio. Para um maior aprofundamento dos conceitos aqui expostos, indica-se a leitura da dissertação "Funções Executivas, Matemática Financeira e Previdência Social: sequência didática para formação", que estará disponível na página do PPGECMT, no endereço https://www.udesc.br/cct/ppgecmt, a partir de Julho/2020.
A Matemática sob um olhar da neurociência
Na linha do tempo dos estudos neurocientíficos, a compreensão de como o cérebro aprende matemática deixou o campo das teorias e especulações em um passado relativamente recente - quando os avanços científicos e tecnológicos possibilitaram a identificação das áreas cerebrais que são ativadas durante a aprendizagem. É por meio desses avanços da neurociência que atualmente se pode "entender por que uma grande parte da população tem dificuldades em aprender, às vezes cálculos simples, apesar de ter oportunidade de ensino e nível intelectual normal" (BASTOS; CECATO, 2015, p. 191).
De forma geral, de acordo com Bastos e Cecato (2015, p. 195), estudos advindos da relação entre o desenvolvimento cognitivo e a matemática, preveem que sua aprendizagem envolve diferentes habilidades, sendo algumas delas:
Bastos e Cecato (2015) afirmam que tais habilidades matemáticas já estão presentes nos seres humanos desde seu nascimento, isto é, "nascemos com áreas cerebrais especificas para o aprendizado da matemática, com habilidade inata para a numerosidade (fluência e flexibilidade com números, o sentido do significado dos números), habilidade para realizar cálculos mentais, olhar para o mundo e fazer comparações" (BASTOS; CECATO, 2015, p. 195).
Desta forma, infere-se que as dificuldades em aprender Matemática podem advir de fatores tanto internos quanto externos. Dos diferentes distúrbios em Matemática, atenta-se para os dois principais, cuja causa é neurológica: acalculia e discalculia do desenvolvimento. De acordo com Bastos e Cecato (2015, p. 198), a acalculia significa "a perda da capacidade de executar cálculos e desenvolver o raciocínio aritmético" e é ocasionada por lesões cerebrais. A discalculia do desenvolvimento - que atinge cerca de 3% a 6% das crianças em idade escolar -, por sua vez, caracteriza-se por "uma dificuldade em aprender matemática, com falhas para adquirir adequada proficiência nesse domínio, a despeito da inteligência normal, oportunidade escolar, estabilidade emocional e necessária motivação" (BASTOS; CECATO, 2015, p. 199).
Em relação a esses distúrbios, "os sintomas encontrados com mais frequência são: 1) erro na formação de números, que frequentemente ficam invertidos, como se fosse uma imagem em espelho; 2) inabilidade para efetuar somas simples; 3) inabilidade para reconhecer sinais operacionais e para usar separações lineares; 4) dificuldades para ler corretamente o valor de números multidígitos; 5) memória pobre para fatos numéricos básicos; 6) dificuldade em transportar números para local adequado na realização de cálculos; 7) ordenação e espaçamento inapropriado dos números em multiplicações e divisões" (BASTOS; CECATO, 2015, p. 199).
Apesar de existirem diversos estudos que visem o tratamento de crianças com tais distúrbios matemáticos, Bastos e Cecato (2015) apontam que, a despeito das ferramentas que auxiliam nessa ação, a melhora do desempenho é mais expressiva quando há a intervenção do professor no processo, pois é o docente quem oferece condições de ensino mais adequadas.
De acordo com Seabra et al. (2014), sabe-se que estudos relacionando as Funções Executivas (FE) e o desempenho escolar já vêm sendo amplamente realizados e que, a partir deles, é possível saber que, "especificamente com relação à matemática, [...] a memória de trabalho teria um papel relevante, pois estaria envolvida nos processos de raciocínio e resolução de problemas" (SEABRA et al., 2014, p. 176); ainda de acordo com os mesmos autores, indivíduos com dificuldades na aprendizagem matemática apresentam prejuízos no controle inibitório e na memória de trabalho.
Nesse sentido, Gonçalves (2017, p. 43) afirma que as FE estão presentes "em operações matemáticas que exigem níveis mais complexos de abstração, como resolução de problemas, álgebra, entre outros". Já Silva et al. (2017, p. 57), argumenta sobre a ação das FE em atividades com jogos matemáticos uma vez que, na sua realização, é necessário "o cumprimento de regras e metas, a tomada de decisão e monitoramento do estado emocional durante a participação de um jogo". Ainda, Silva, Santana Filha e Fonseca (2018, p. 9) relacionam as FE a etnomatemática devido ao fato de que "situações reais envolvem a tomada de decisão para a construção de determinada representação, envolvendo o córtex pré-frontal do cérebro" - área essa que é responsável pelas Funções Executivas.
A Matemática Financeira na sala de aula
Sobre o ensino da Matemática Financeira, a proposta curricular catarinense prevê que esse seja realizado no decorrer de todo o Ensino Básico, de forma que o nível de rigor matemático aumente ao longo dos anos (SED, 1998). Desta forma, sugere-se que a partir do Ensino Fundamental II o tratamento do conteúdo ocorra de forma mais sistemática, deixando de explorar apenas a noção social do tema para adotar uma linguagem matemática que inclua a manipulação algébrica, até que se encerre em torno da 2ª série do Ensino Médio - contudo, não impedindo que os docentes alterem o período de trabalho do assunto, conforme necessário (SED, 1998).
Entretanto, apesar de diferentes diretrizes educacionais dissertarem a respeito de um ensino da Matemática que torne os alunos em cidadãos críticos, capazes de relacionar a teoria aprendida em sala de aula com a prática da vida diária, entre outras competências; é comum observar na literatura a respeito da Matemática Financeira (NASCIMENTO, 2004; POSSIEDE JUNIOR; JOUCOSKI, 2008; HERMINIO, 2008; MUNIZ JUNIOR, 2010; OLIVEIR; CREMASCO, 2013), um argumento recorrente: os alunos não conseguem relacionar o conteúdo matemático a sua realidade e tampouco são capazes de utilizar o que aprenderam nas aulas de Matemática em situações diversas de seu dia a dia.
De acordo com Hermínio (2008, p. 54), "muitas vezes, os alunos deixam perdidas, uma série de informações matemáticas recebidas, por não saberem relacionar essas informações com o seu cotidiano". Portanto, observa-se que vem ocorrendo uma falha em comunicar com clareza aos alunos, os impactos da estrutura financeira vigente - no caso do Brasil, o capitalismo - em suas vidas. De forma geral, Hermínio (2008, p. 58) apresenta quais são as maiores dificuldades encontradas no ensino da MF em relação ao dia a dia do estudante:
Assim, é possível perceber que as práticas pedagógicas que vêm sendo adotadas no ensino da MF, não são tão eficientes em inserir os alunos do Ensino Médio em uma discussão significativa sobre as transformações que ocorrem frequentemente no cenário econômico. Dentro do contexto desse trabalho, percebe-se ainda uma menos atenção à questão da aposentadoria que, atualmente em processo de reforma, irá afetar com maior impacto os alunos que hoje, e que posteriormente adentrarão, nessa fase escolar.
Dado que esse material é direcionado a você, professor de Matemática em formação inicial, não será realizado um aprofundamento sobre os tópicos e as metodologias por meio das quais a Matemática Financeira pode ser ensinada. Contudo, sugere-se a leitura, como início de sua pesquisa, do livro "O ensino da Matemática Financeira: do livro didático ao mundo real", de Vitor Amorim, que você pode encontrar na aba Materiais para estudantes.
REFERÊNCIAS
BASTOS, J. A.; CECATO, A. Matemática: problemas e soluções. In: DIAS, N. M.; MECCA, T. P. (Org.). Contribuições da neuropsicologia e da psicologia para intervenção no contexto educacional. São Paulo: Memnon, 2015, p. 191-212.
GONÇALVES, et al. Funções executivas predizem o processamento de habilidades básicas de leitura, escrita e matemática? Revista Neuropsicologia Latinoamericana, Porto Alegre, v. 9, n. 3, p. 42-54, 2017. Disponível em: https://bit.ly/2VvMLvK. Acesso em: 15 ago. 2018.
HERMÍNIO, P. H. Matemática Financeira: um enfoque da resolução de problemas como metodologia de ensino e aprendizagem. 2008. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) - Universidade Estadual Paulista, Rio Claro, 2008.
MUNIZ JUNIOR, I. Educação Financeira: conceitos e contextos para o Ensino Médio. In: Encontro Nacional de Educação Matemática, 10., 2010, Salvador. Anais eletrônicos... Salvador: SBEM, 2010. Disponível em: https://bit.ly/2XU9rDD. Acesso em: 16 fev. 2019.
NASCIMENTO, P. L. A formação do aluno e a visão do professor do Ensino Médio em relação à Matemática Financeira. 2004. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2004.
OLIVEIRA, D. P.; CREMASCO, N. R. A Matemática Financeira e o cotidiano do aluno do Ensino Médio. Os desafios da escola pública paranaense na perspectiva do professor PDE: artigos, Curitiba, 2013. Disponível em: https://bit.ly/2TYWtqC. Acesso em: 31 out. 2018.
POSSIEDE JUNIOR, O.; JOUCOSKI, E. O ensino da Matemática Financeira: relato de uma experiência de aprendizagem. Dia a Dia Educação, Curitiba, 2008. Disponível em: https://bit.ly/2GPadw2. Acesso em: 05 out. 2018.
SEABRA, A. G. et al. Modelo de funções executivas. In: SEABRA, A. G. et al. Inteligência e funções executivas: avanços e desafios para a avaliação neuropsicológica. São Paulo: Memnon, 2014, p. 39-50.
SED. Secretaria de Estado da Educação de Santa Catarina. Portal da Educação. Florianópolis: 2019. Disponível em: https://bit.ly/2DfMdkR. Acesso em: 24 abr. 2019.
SILVA, L. P. et al. Jogos Matemáticos e Etnomatemática: paralelismo entre tendências metodológicas da Educação Matemática à luz da Neurociência Cognitiva. Caminhos da Educação Matemática em Revista, Aracaju, v. 7, n. 2, p. 53-65, 2017. Disponível em: https://bit.ly/2GNEuv3. Acesso em: 25 abr. 2019.
SILVA, L. P.; SANTANA FILHA, L.; FONSECA, L. Neurociência e Etnomatemática: uma articulação possível. In: Colóquio Internacional "Educação e Contemporaneidade", 12., 2018, São Cristóvão. Anais Eletrônicos... São Cristóvão: Educon, 2018. Disponível em: https://bit.ly/2Vz7xKS. Acesso em: 26 abr. 2019.
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