Escrito por Gilmar de Oliveira
Dentre as novas políticas educacionais pertinentes à Educação brasileira, seja frente aos desafios dos próximos 10 anos para a Educação Básica, como nas constantes exigências que as secretarias municipais e estaduais de Educação fazem às unidades escolares, vemos o termo Educação Inclusiva ter destaque. Atualmente, espera-se que as escolas estejam com a consciência de inclusão das pessoas com deficiência no processo ensino-aprendizagem, com adaptações curriculares, acessibilidade, cuidados específicos e integração ao ambiente escolar, interações positivas e capazes de estimular habilidades e competências, seja pela socialização, equalização das possibilidades cognitivas (em vez de olhar a limitação, olhando-se o potencial da pessoa) ou valorização de características.
Os projetos são muito bonitos no papel, as exigências para que as escolas se adaptem, que ofereçam acesso, integração e aprendizagem adequadas parecem – e são, de fato – muito justas. E a realidade é muito crua e cruel. Os professores se esforçam, pesquisam alternativas de ensino para melhorar aprendizagem, desempenho, equalizar avaliações, mas fazem isso quase sempre na boa vontade, na experiência de leigos que se engajam, mas que carecem de orientações especializadas, para lidar com alunos com as mais diversas deficiências, variadas síndromes, diferenças de estágios cognitivos. Muitos mestres acabam desistindo de procurar recursos, seja por falta de conhecimento, por falta de estrutura de apoio da escola, outros por entenderem que, frente a uma sala tão cheia, preparar aulas e técnicas diferenciadas pode tomar tempo e deslocar o foco para um ou dois alunos, enquanto os demais trinta e tantos alunos ficam sem o devido acompanhamento das aulas e lições.
A notória falta de supervisores e orientadores escolares, a falta de psicólogos escolares e, mais apropriadamente, de psicopedagogos institucionais enfraquece as tentativas de termos a verdadeira inclusão escolar.
Muitas são as atribuições aos especialistas, que precisam, muitas vezes, sair de seus afazeres inerentes ao cargo, para darem contas de demandas que chegam das Secretarias de Educação, como fichas, formulários, projetos, testes de verificação ou relatórios de rendimento. Sem contar reuniões infindáveis e infrutíferas, isso sem contar as pressões por apoios políticos (sim dentro de reuniões de especialistas e em horário de trabalho) em épocas de campanhas eleitorais. Assim, como sobra tempo para que um supervisor pedagógico ou psicopedagogo venha a sentar e pesquisar? E, depois, quando será que ele irá se reunir com seus professores, para colocarem em forma de planos de aula as alternativas para bem educar os alunos com deficiência ou aqueles com dificuldades e transtornos de aprendizagem? Quando se reunirão com os pedagogos da Sala de Atendimento Educacional Especializado (AEE)?
E o quadro piora quando sabemos que, em muitos estados, supervisores pedagógicos de carreira estão em extinção. Alguns estados possuem atendentes ou técnicos pedagógicos, fazendo as vezes de orientadores e supervisores, sem terem, necessariamente, formação e conhecimento técnico (vindo da universidade) para atuarem como pedagogos supervisores ou orientadores educacionais. Alguns destes técnicos são professores readaptados, nem sempre (ou quase nunca) pedagogos de formação; outros licenciados, mas não pedagogos. As redes estaduais da maioria dos estados brasileiros têm esta perspectiva.
Ainda assim, leitoras (es), o quadro é pior. Isso porque mesmo em redes de ensino mais estruturadas, como muitas redes municipais no Brasil afora, os supervisores têm pouca ou nenhuma formação em Educação Inclusiva, pois pouco se estuda nos currículos de Pedagogia sobre deficiências motoras, intelectuais, múltiplas deficiências, nem sobre síndromes, surdez, cegueira, imaturidades cognitivas, o espectro autista é visto de forma sucinta. Não se estuda características, sintomas, nem a Fisiologia do Sistema Nervoso, efeitos de medicações e tantas informações e conhecimentos que geram domínio da situação e saberes essenciais para que um profissional os profissionais venham a montar estratégias de atendimento adequado e aulas que de fato produzam saberes.
Pode ser pior? Pode. E é! Raras escolas da Rede Pública contam com psicopedagogos e a formação destes profissionais ainda é incipiente no país. Raras as escolas públicas que contam com psicólogos escolares e, quando estão na escola, a estrutura é precária, sem material de trabalho e sequer sala possuem.
Outra mazela tem a ver com as salas de AEE. Dá para contar nos dedos da mão as cidades que possuem atendimento para crianças com deficiência onde as pedagogas sejam formadas em educação Especial ou recebam, de fato, treinamento e capacitação para poderem atender os diversos quadros de alunos com as mais diversas deficiência. Sem contar que as cidades do interior alegam não terem estrutura e verba para manterem salas assim, contrariando decisões do MEC, do Ministério Público e sem o mínimo de bom senso e interesse. Quando tem pedagogas, falta estrutura para atender e bem educar. Assim como os cuidadores e cuidadoras, em quase 100% das cidades, quando existem e cedidas pelas Secretarias de Educação, não possuem formação superior específica ou são apadrinhadas políticas, que ficam na sala de AEE como cabide pelo apoio ao vereador amigo do prefeito.
As faculdades de licenciatura, como Letras, Matemática, Geografia ou Biologia também não possuem a disciplina de Educação nas Deficiências, Transtornos da Aprendizagem ou Síndromes. Até mesmo o TDA-H, a dislexia são desconhecidos dos futuros professores, que sabem apenas o que a imprensa divulga.
Lembro que a rede Particular (15% dos alunos do país), em geral, apresenta os mesmos problemas. Portanto, o que fazer? Qual a solução? Eu penso que o primeiro passo é investir em treinamento, atualização e qualificação dos profissionais que já atendem e que o MEC venha a exigir que os cursos de licenciatura ofereçam as disciplinas que capacitem o entendimento do universo das pessoas com deficiência e transtornos de aprendizagem.
Não há outro caminho, a não ser exigir formação e capacitação! É oferecer cursos de qualidade, oficinas, workshops com especialistas diversos, de renome, acesso a leituras. Os pais e os profissionais devem se unir para que cobrarem dos políticos ligados à Educação, que raramente sabem o mínimo da área, para lembrar que os deficientes existem e que Educação Inclusiva não é jogar ou deixar a criança na sala de aula. É oferecer ensino e formação ou ao menos a devida socialização aos mais comprometidos. É preparar todos os profissionais e os alunos também para conviverem com as diferenças, a ter por base o respeito, a solidariedade e a colaboração. Porque, na verdade, os alunos com deficiência é que chegaram para nos ensinar a abrir mentes e corações à diversidade, à vida, ao amor.