Escrito por Gilmar de Oliveira
Passei uma situação já esperada neste mês de março: um aluno entrou armado na escola pública onde trabalho. Deixou a pistola dentro da mochila de uma aluna, depois que suspeitou que havia sido denunciado. As balas estavam dentro de seus tênis, na ponta dos dedos.
Ele se ligou nos últimos meses a adolescentes que traficam e tentam representar facções de tráfico. E passou a ser usuário. Tem família que o sustenta, que lhe dá uma boa estrutura.
Mas desde que comecei a trabalhar nesta escola, orientei a mãe a procurar por psicoterapia, pois ele apresentava características de impulsividade, baixa capacidade de reflexão e planejamento, atenção rebaixada nas aulas e uma conduta de se juntar com os alunos que mais apresentavam alterações de conduta.
Mas não posso obrigar a fazer psicoterapia, e suas transgressões na escola não eram violentas, nem acintosas. A partir do momento que se viciou em crack, coisa de 45 dias, segundo a mãe, tornou a vida dele e de todos a seu redor um verdadeiro inferno.
Nesse momento, o psicólogo escolar, quando sabe das alterações de conduta, procura chamar e entender a demanda e a dinâmica da situação, mas realmente no estágio inicial de abuso de substâncias psicoativas, não há alterações físicas claramente definidas ao uso de drogas.
O aluno foi, nesse período onde a mãe acredita que ele iniciou com as drogas, orientado em duas ocasiões. O aluno faltou muitos dias, mas estava indo bem na escola, dentro de suas características normais.
A questão é que nem sempre se percebe, se estampam no rosto as alterações e as opções pelas coisas erradas. A escola não tem como adivinhar situações pontuais como esta. Nem como impedir (nem deve!) o acesso de alunos sabidamente usuários de drogas, pois isto aumenta a exclusão e os empurra ainda mais às drogas.
Podemos prevenir, mas nunca prever situações críticas e não usuais; muito menos em escolas com poucos profissionais, muitas demandas e quase nenhuma estrutura.
O que podemos fazer é orientar, encaminhar, alertar pais, orientar professores, observar comportamentos e buscar informações e pedir ajuda.
Conseguimos evitar uma tragédia?
Não creio que o aluno usaria a arma na escola; provavelmente alugaria ou venderia para outros jovens, que o usariam algum crime.
Mas esta questão abre um precedente, uma possibilidade de que tais fatos sejam mais comuns do que supomos. A maioria não mostra a arma aos colegas, porque podem ser denunciados, então não há muito a fazer.
Quanto à escola, as ações precisam ser de prevenção, esclarecimento e principalmente de conscientização e valorização dos alunos que podemos manter com boa qualidade de ensino e de postura exemplar.
Acredito que a escola deva ter vigilantes armados nas portarias. Ainda assim, só se previnem armas com detectores de metal, e olhe lá. Contar com estes aparelhos na escola é inviável, nem nos EUA, com toda a epidemia de ataques com armas de fogo, esta solução é viável.
Mas a grande ação que realmente faz a diferença, para que as crianças e adolescentes jamais se envolvam com armas, neguem drogas e pensem em um futuro, é EDUCAR COM QUALIDADE E ÉTICA, conscientizando, desde as séries iniciais, sobre o horror da violência. É necessário, o mais cedo possível, ensinar que violência e desonestidade causam prejuízos na vida.
É preciso mostrar alternativas para as duras realidades que trazem de suas ruas, de suas casas. Todo conteúdo deve ser pensado para que, sempre que possível, se pense em uma cultura de paz, de compromisso com um futuro melhor.
E quando se oferece aos alunos ocupações atraentes, como esporte, teatro, musicalidade, cursos profissionalizantes e reforço escolar, além de assuntos bem focados na realidade dos alunos, o interesse pela marginalidade e pela transgressão cai.
Nada disso funciona se os pais não forem também trabalhados, esclarecidos, integrados a uma visão de mundo que evita a violência, preconceito e saibam educar com atenção, carinho e diálogo. Tarefa difícil? Sim, na realidade de uma sociedade doente como a nossa, muito precisa ser feito na forma de implantar escolas em tempo integral.
Mas o que não cabe é professores fazerem eco à cultura do ódio de políticos lunáticos, que alimentam fantasias de armar a sociedade, de pensar que só repressão e morte combaterão o crime. Acordemos!