Escrito por Gilmar de Oliveira
A sociedade vem mudando. Há um debate luta constante nas redes sociais (antigamente, seria nas praças, bares e escolas ou universidades) para que se possam respeitar os direitos de grupos específicos que fogem do padrão mais comum (e não do padrão “normal”), de proporcionar direitos iguais e a quebra de preconceitos.
Também começamos a ver que não dá para engolir certas condutas machistas, sexistas, sectárias e, principalmente, vemos que a violência está, a cada dia mais, fincada no rol das coisas malditas, que precisam ser banidas do planeta.
Também cresce nossa indignação contra a corrupção, contra abusos ou crimes, mas este repúdio fica restrito ao comodismo de comentarmos nas redes sociais. Não há mais a devida mobilização de cobranças a quem se precisa cobrar, sem a atitude de levar as discussões para as salas de aula, para nosso cotidiano fora da vida virtual. Quando vemos a violência se manifestar frente a alguma covardia, esta nos chega através das redes sociais ou meios de comunicação - que também se alastram pelos aplicativos de celular conectados com pessoas que nós conhecemos ou que respeitamos ou seguimos. São rapidamente reproduzidas e comentadas nas redes sociais, claro, onde a doença social do brasileiro fica mais escancarada: frente aos fatos violentos e criminosos os comentários dos leitores demonstram ainda mais violência, ainda mais dolo, os mais repugnantes desejos de vingança - pois neste país percebe-se que justiça se confunde o tempo todo com vingança.
Como um raio, vemos crescer nos noticiários os casos de violência contra professores, educadores e contra alunos: tiros nas escolas, agressão a professores, ameaças, carros depredados, mais agressões a diretores e orientadores.
Muitas das agressões não foram sequer denunciadas às delegacias especializadas. Educadores ameaçados e agredidos reproduzem o que vemos em esposas agredidas: omitem a denúncia reforçando a conduta do agressor, protegido pelo anonimato. O silêncio e a nossa omissão apenas favorecem aos agressores e, no Brasil, a maioria das investigações que não envolvem famosos ou crimes graves só deslancha se as ações viram polêmica, como a professora de Indaial, que denunciou, botou a boca no mundo e conseguiu mobilização e punição contra a agressão e contra o aluno agressor.
Claro que, falando em aluno agressor, por trás de cada história de agressão, de violência nas escolas, há uma realidade de marginalidade, de exclusão, de miséria humana e social. Assim como nas famílias de classe média, onde um aluno pega uma arma e atira dentro da escola, há um cenário propício - mesmo que silencioso - de desequilíbrio mental, de abandono ou desestrutura afetiva. Um adolescente ou uma criança normal, criado em condições adequadas do ponto de vista emocional, social relacional e com acesso à informação e bem socializado raramente chega a agredir alguém, salvo quando provocado de forma intensa e, ainda assim, de forma leve, como empurrão ou tapa, quando muito, o que já é muito sério e jamais deve ser tolerado, admitido. Quanto maior a desestrutura, maior a rotina de desrespeito, de provocações e reações ou mesmo iniciativas que envolvem sadismo, crueldade, bullying ou atos de violência que causem ferimentos e dores fortes. Quando isto acontece no ambiente escolar, reproduz-se uma rotina dura de exclusão social, de abandono afetivo, material, de falta de ação e atitude por parte da família, dos pais, das equipes pedagógicas ou de todos juntos.
Essas faltas de atitudes, a ausência de medidas estratégicas, pensadas para serem eficazes, de assistência, apoio e recursos terapêuticos é que constroem o marginal, o bandido, o monstro sádico, o garoto sem empatia e cruel, independente de classe social ou nível instrucional dos pais. Mas é fato que as famílias que possuem recurso e alguma disposição para procurar ajuda terapêutica (psiquiatras, psicólogos) ainda buscam, ou as escolas que possuem especialistas que saibam como agir e para quem encaminhar conseguem reduzir, minimizar ou resolver a situação. O que chega aos extremos são os perfis de alunos que passaram por todos os filtros possíveis que reduziriam seus dramas, seus desequilíbrios, suas distorções da realidade. O resultado é a agressão, a violência, a ruptura com as regras sociais, formando o marginal. A escola, a família e os órgãos do governo precisam se atentar para ações preventivas, e parar para repensar as posturas adotadas para prevenir e, sobretudo, que admitamos: NÃO, não estamos preparados para salvar os alunos transgressores de si mesmos, nem de proteger os alunos e professores de serem vítimas. Precisamos repensar e tomar um rumo de conter a violência.
Dedico este artigo a meu vice-diretor e amigo João Carlos, agredido ontem por um aluno de 14 anos, que várias vezes transgrediu, que tentamos recuperar, mas que do alto de suas carências e frente à inoperância do Estado, ainda adentrava a escola para usá-la como depositorio de suas desestruturas.