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Centro de Educação a Distância

Jornal da Educação

Psicologia e Educação (Edição Dezembro/2015)

O PESADELO DE REPROVAÇÃO

Escrito por Gilmar de Oliveira

Chegamos a mais um final de ano letivo. Aí, entra a questão-chave: os professores revoltados com alunos “sem compromisso, desinteressados, indisciplinados e sem o preparo esperado” e, ainda assim, obrigados a aprová-los. As Secretarias de Educação precisam de grandes números de aprovados, porque isso melhora os indicadores de qualidade na Educação, o que resulta em mais verbas, mais propaganda política, mas quase nunca melhora a aprendizagem, acabam por pressionar diretores que, por sua vez, pressionam professores. Os professores, infelizmente, quando se deparam com as situações de não-aprendizagem e de desinteresse dos alunos, acabam confundindo reprovação com vingança, com punição. Terrível engano. Prejuízo ao país, à escola, ao aluno e ao professor.

No Nordeste, percebo que, nas cidades de vários estados que visito, não há pressão política por aprovação (nem diretrizes educacionais definidas) e os índices de reprovação são altíssimos! Curiosamente, dos alunos que atendi e outros que conversei, os que mais reprovaram são os que menos importância dão à Educação, tal e qual no Sul. Os reprovados não mudam para uma postura de interesse. Ao contrário: desanimam ainda mais, prejudicando um futuro, a auto-estima, a segurança.

Por outro lado, reprovar os alunos “irresponsáveis” acima citados não melhora a qualidade da Educação. Ao contrário: alunos com distorção idade-série se evadem, são os mais indisciplinados, continuam com baixo desempenho e, ao longo dos nove anos do Ensino Fundamental, reprovam mais de duas vezes, fazendo-os sair dessa etapa com 17 anos ou mais, idade que deveriam terminar o Ensino Médio, entrar na faculdade. É um prejuízo enorme ao país.

Reprovar aluno bagunceiro é um tiro no pé, pois ele fica ainda pior no ano seguinte e você vai lidar com ele por mais anos. Transferir de escola é outra situação fora de questão, atualmente, pois o próprio Conselho Tutelar ou o Ministério Público podem devolver o aluno à escola. Basta a mãe dar queixa, se o aluno é menor de 18 anos, a vaga do aluno é plenamente resguardada e ele volta rindo.

Mesmo com todas as anotações de ocorrência, mesmo com toda a documentação da escola provando que determinados alunos tem condutas anti-sociais e até cometem crimes (ops, desculpe, se é menor não é crime, é ato infracional...) precisam ficar na escola. Mas como lidar? E a capacitação? 

Claro que a maioria dos casos é de alunos com risco social ou transtornos emocionais somados ao desequilíbrio familiar e a escola não dá conta de lidar. No Sul, raras as escolas possuem psicólogos escolares e assistentes sociais. Mas, aqui no Nordeste, muitas cidades, como João Pessoa, na qual sou psicólogo educacional da Rede Municipal, temos equipes completas e pouca coisa muda. Não basta ter psicólogos e não ter instrumentos de trabalho, como testes e exames; não basta ter assistentes sociais e nenhuma estrutura de visitas, convênios, órgãos de apoio. Sem base, nada de bom trabalho. 

O certo é que reprovar alunos com baixa aprendizagem e com grande indisciplina é mais nocivo que aprová-los. Alunos com baixa aprendizagem têm alguma alteração cognitiva que não foi diagnosticada. Quando não é algo inibindo o raciocínio, a atenção, a memória, é alguma defasagem sensorial (visão, audição) ou situação social, familiar ou estrutural, quando não todas juntas. Qual o diagnóstico? Quando há, a lei os protege e não podem reprovar (o que é certo); mas a maioria não possui diagnóstico, nem acompanhamento diferenciado, nem avaliações que diminuam o efeito do déficit de aprendizagem que o aluno traz. 

Então, qual a utilidade da reprovação? Em muitos casos, a ampla maioria, alunos imaturos aos seis anos evoluem bem quando colocados a continuar o ciclo inicial (não repetir, pois não o fizeram uma vez, mas continuar o processo). Mas o PNE e seus pseudo-especialistas não permitem a reprovação antes do terceiro ano. A reprovação deveria acabar. O acompanhamento constante, o diagnóstico nas escolas, as intervenções de pedagogos, psicólogos, assistentes sociais e demais profissionais num trabalho contínuo, em salas menores, reduziria o déficit de aprendizagem. Quanto aos insolentes e indisciplinados, estes só existem porque se ignora o regimento da escola, os professores acabam sem o devido treinamento para manterem o encanto e o domínio de turma, mesmo se for preciso se impor.  Enquanto a utopia não se realiza, não é o aluno quem deve pagar pelas falhas do processo.

 
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