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Jornal da Educação

Psicologia e Educação (Edição Agosto/2012)

As cotas nas universidades federais: paradigmas quebrados

Escrito por Gilmar de Oliveira

Começo a escrever este artigo após ler a notícia que o governo reservará metade das vagas das universidades federais, já em 2013, para os alunos egressos das escolas públicas, além das cotas raciais já obrigatórias. Acho excelente a ideia das cotas e sempre a defendi, pois deu certo nos países onde este sistema vigorou, fazendo surgir gerações de profissionais liberais e de alto valor agregado à mão de obra de pessoas sem acesso, seja por discriminação, seja por falta de oportunidade ou de visão de mundo. Também apoio veementemente a inclusão de estudantes de escolas públicas nas instituições federais, mas ainda essa não é a saída...

Em 2005 e 2006, lecionando a turmas de pós-graduação na Bahia, onde a população é 90% negra (segundo dados do IBGE), a sala de aula com 40 alunos tinha três alunas negras. Menos de 10%, menos que na loiríssima Noruega! Os próprios alunos contaram que em seus cursos de graduação havia um número reduzido de negros. Por acaso os afrodescendentes não gostam de estudar? Ou há por trás disso uma cultura de exclusão que leva a crer que estudo não é para todos? Sem contar o abandono à escola para sustento da família, uma infeliz realidade ainda hoje em nosso país, talvez mais próximo de sua casa que você imagina, amigo leitor.E Santa Catarina? O problema não é "apenas" o racismo, mas exclusão de classes pobres.

Onde estão os alunos egressos das escolas públicas, se olharmos dentro das salas de aula das federais? Por acaso, aluno de escola pública quer pagar mensalidade nas faculdades particulares? Qual a renda familiar média dos alunos das universidades federais? Onde estudaram?

Todos sabem que a imensa maioria dos alunos das faculdades federais veio de escolas particulares ou de cursinhos preparatórios, pagos pelos pais de maior poder aquisitivo.

Como a escola pública secundária brasileira é capenga, é de um baixo nível vergonhoso até para padrões africanos, entra nos melhores cursos das federais (ou das pouquíssimas universidades particulares com ótimo padrão) aquele aluno que pagou por melhor instrução, com raríssimas exceções. Quando há alunos oriundos de escolas públicas nas federais, os cursos que frequentam são os menos concorridos, que sobram vagas.

O que isso indica? Que as cotas raciais e sociais (chamo assim para a cota de escolas públicas), mesmo forçadas pelo governo, formarão uma geração de médicos, engenheiros, advogados, administradores, empreendedores, artistas, psicólogos e demais áreas concorridas e de alto valor agregado, com pessoas que puxarão para cima seus padrões financeiros e sociais e os de sua família, com o próprio esforço. Mas o problema ainda não é esse...

Também forçarão para cima, indiretamente, os índices de qualidade sofríveis das instituições particulares, de uma qualidade vergonhosa na imensa maioria dos casos. Isso acontecerá à medida que os alunos vindos do Ensino Médio de escolas particulares, acostumados com maior qualidade, passem a frequentar e exigir aulas decentes nas faculdades privadas, nos níveis de exigência que tinham outrora.

Não precisaremos de cotas para a vida inteira, mas por uns 20 anos, no máximo, como aconteceu no Chile, nos EUA e alguns países europeus. Será o bastante para vermos nossos filhos atendidos por médicos negros, por exemplo, nos hospitais e clínicas. Tanto faz a cor da pele de um profissional, mas é triste saber que no Brasil, ainda existam profissões com apenas uma cor de pele. As pessoas querem se ver nos melhores cargos e não pensarem que há profissões de ricos e de pobres. Eu, particularmente, adoraria ver muitos mimados e suas famílias confiadas perderem as benesses de quem sempre teve privilégios, onde a lei vale para os outros. Estes mesmos que reclamam do governo distribuir bolsa escola e vale gás, mas deixam seus filhos em universidades públicas, no lugar de quem não pode pagar.

No lugar da prestação do carrão e da casona, que invistam em mensalidades de faculdades particulares, dos filhos, ou os coloquem para trabalhar mais cedo, para entenderem como funciona a vida no mundo real. Claro, o problema ainda não é esse...

O problema da Educação Superior no Brasil é simples, matemático: Se todos tiverem acesso ao ensino superior, teremos vagas para todos? É esse o problema: não terão vagas, só isso.

 
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