O livro Diálogos e Trajetórias - Da perspectiva individual à docência compartilhada é resultado da reflexão e prática presenciada por um grupo de educadoras em formação durante o estágio curricular supervisionado. Através dele, as acadêmicas do curso de pedagogia da Universidade da Região de Joinville – Univille, orientadas pelas professoras Jordelina B. Anacleto Voos e Rosana Becker compartilham com o leitor as experiências e vivências com crianças da educação infantil e séries iniciais das escolas públicas e particulares da região de Joinville.
A idéia do livro foi concebida pelas professoras Rosana e Jordelina, enquanto eram professoras de estágio e orientadoras dos acadêmicos do curso de pedagogia da Univille. A premissa era criar algo que respondesse alguns dos questionamentos que elas tinham e que, ao mesmo tempo, recebiam de suas alunas.
O intuito foi desenvolver um registro sistematizado dos estágios curriculares das acadêmicas de pedagogia, realizados entre 2007 e 2008.
“Decidimos reunir os projetos desenvolvidos durante esses dois anos de estágio, aproveitando as discussões sobre a matrícula obrigatória aos seis anos e outras expectativas da carreira docente.
Para mostrar práticas pedagógicas inovadoras, situações provocativas e interferentes, geradas nos debates das alunas enquanto educadoras em formação”, explica Rosana.
O projeto de escrever um livro também motivou as alunas, mas ao mesmo tempo causou certa resistência. “Escrever é quebrar rochedos. Então buscamos estimular as alunas a correr riscos e se expor, pois a escrita é um hábito que se aperfeiçoa ao praticar”, declara.
Rosana e Jordelina são as organizadoras do livro e orientadoras dos projetos e dos artigos neles publicados. Os textos foram produzidos pelas acadêmicas com co-autoria das próprias professoras da classe onde as atividades foram realizadas.
“As alunas levaram conhecimento acadêmico para sala de aula e em troca receberam experiência. Isso que chamamos de docência compartilhada. Os registros e as atividades são construídos em conjunto, o que enriquece a experiência das acadêmicas e do professor de classe”, explicam as organizadoras.
Importância do estágio supervisionado
O estágio é a síntese do curso, é um momento muito esperado pelo aluno, que quer colocar em prática tudo aquilo que aprendeu ao longo da faculdade.
“Ele é uma possibilidade de contribuição conjunta, de aprendizagem e ensinamento ao mesmo tempo. Muitas vezes o professor trabalha 40 ou 60 horas e se desprende da teoria, que é imprescindível. Então, durante o estágio, o professor de classe entra com a sua experiência e o aluno leva a fundamentação teórica”, justifica Rosana.
“Para o professor, romper com o que tem segurança é difícil, nós sabemos disso. A mudança assusta, porém o estágio curricular não deve ser encarado como um ato isolado, mas uma troca e apoio entre todos os envolvidos”, completa Jordelina.
Durante os dois anos de estágio, acadêmicos e professores criam vínculos. Em um primeiro momento, o estagiário conhece a realidade da escola e seus alunos. Após isso, troca idéias com os professores, insere-se na realidade do professor/escola, conhece os alunos para poder compartilhar as experiências. Num terceiro momento é desenvolvida a docência, pois as relações já estão amadurecidas.
Os orientadores de estágio devem fornecer sustentação incondicional nesse processo vivido pelo acadêmico, assim como se envolver no projeto, dar idéias e sugestões.
Rompendo com a prática pedagógica padrão
O livro tem a proposta de romper com a prática pedagógica padrão, que é centrada em práticas tradicionalistas, realizadas de forma desarticulada e com a fragmentação da aprendizagem, o que acontece na grande maioria das escolas do país.
“As alunas desenvolveram projetos diferenciados, analisando sob uma nova perspectiva a questão da infância. A criança é colocada como protagonista da aprendizagem e não apenas como um sujeito passivo”, esclarece Jordelina.
As professoras explicam que muitas vezes falta compreensão e fundamentação teórica sobre a importância da ludicidade na aprendizagem.
“O professor conhece e compreende que a ludicidade faz parte da infância e da educação, mas quando a criança entra no primeiro ano do ensino fundamental, muitas vezes passa a ser tratado como adulto e frases do tipo: ‘chega de brincadeiras’, ‘aqui não é mais o jardim’, ‘agora é hora de estudar’ são freqüentes”, completam as professoras.
Os relatos apresentados contemplam propostas que articulam a educação infantil com as séries iniciais do ensino fundamental, demonstrando as possibilidades de desenvolvimento da criança de forma compartilhada, evitando a fragmentação comum nos programas de ensino das escolas.
Problematizam também a relação entre docência e infância, colocando a criança como foco principal no processo de aprendizagem, em que o brincar, letrar, alfabetizar e o próprio espaço físico atuam como importantes instrumentos nessa fase.
Depois da publicação, o desafio
Foram impressos 500 exemplares do livro, à venda nas Livrarias Curitiba, Midas, Sebo e no site da Allprint Editora (www.allprinteditora.com.br), a R$38,00.
Entretanto, o livro ainda não está acessível a todos os professores. A idéia inicial era disponibilizar ao menos um exemplar para cada escola pública da região, porém não houve interesse das prefeituras em custear a compra. Entre estas prefeituras, apenas São Francisco do Sul, sensibilizado com a proposta, comprou um exemplar para cada escola.
“Falta, no professor, a cultura de comprar livros. Afinal, são as nossas ferramentas de trabalho, necessitamos deles para aperfeiçoarmos as nossas práticas pedagógicas”, relata Rosana.
A publicação pode ser utilizada como um referencial atualizado, como fundamentação e inspiração para as práticas pedagógicas desenvolvidas.
“Esperamos que o professor tenha interesse pelos projetos apresentados, leiam o livro, façam sua crítica e mais, se encorajem a também publicar suas experiências”, discorre Jordelina
Novos projetos
As professoras revelam que a parceria pretende continuar. “Temos muitos projetos em construção, pretendemos intensificar os escritos sobre a educação e a infância, já que, como estamos vivenciando as rotinas da escola, compartilhando e discutindo conhecimentos, podemos falar com propriedade sobre o tema” esclarecem.
Elas tem em pauta ainda parceria com a Universidade de Atacama, no Chile e projeto de aprendizagem baseado em problemas, entre outros projetos desenvolvidos pela Gered .
Jordelina
A professora Jordelina aprendeu a ler e escrever com ajuda da mãe, aos quatro anos de idade. Seu pai, sensibilizado pelo interesse da filha em aprender, construiu em suas terras uma escola que fosse mais próxima de casa, para que ela e as crianças vizinhas pudessem estudar.
Em Joinville, Jordelina fez o curso de docência, aos 15 anos e, em 1973, formou-se em Pedagogia na primeira turma da ACE. Em 1982 deixou de ser professora primária para se especializar na orientação escolar da rede estadual de ensino.
Posteriormente atuou na Univille como professora universitária.
Desde 2002, voltou ao Estado, dividindo então seu tempo entre as aulas na universidade e a orientação escolar na EEB Rudolfo Meyer.
Jordelina é Mestre em Educação pela Pontifica Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Doutora em Engenharia da Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina e Pós Doutora pela Universidade de Atacama – Copiapo – Chile.
Rosana
“Comecei a lecionar quando tinha 16 anos. Na época ser professora era sinônimo de status e valorização na sociedade”, revela Rosana. Formada em pedagogia no ano de 1985, atuou como professora de educação infantil em Corupá, cidade onde nasceu. Mais tarde, em Joinville, entrou para a rede estadual de ensino.
Em 1986, mudou-se para o estado do Mato Grosso, e por oito anos, trabalhou com a educação. Novamente em Joinville, atuou como diretora escolar e de ensino na Gerência de Educação. Em 2009, entrou na rede municipal e hoje é supervisora escolar na EM Anita Garibaldi e pelo estado está lotada na EEB Presidente Médici. Rosana é Mestre em educação pela Universidade do Estado de Santa Catarina.