A frase de Reuven Feuerstein pode ser considerada a essência do pensamento do psicólogo e professor universitário Marcos Meier, em palestra proferida aos pais e professores, do Colégio dos Santos Anjos, no dia 19 de agosto.
Na palestra, exemplificou com ações práticas, o papel dos pais (e professores) na formação integral da criança e do adolescente, no desenvolvimento da inteligência e no planejamento de vida.
Joinville- Em toda a sua palestra e em entrevista exclusiva à jornalista Maria Goreti Gomes, do Jornal da Educação e do Jornal Santos Anjos, Meier reforçou que é preciso considerar que "o que faz a diferença no desenvolvimento da inteligência é a superação de dificuldades, a conquista de desafios, a multiplicidade de estímulos integrada à situações-problema".
Portanto, os pais e professores devem criar situações problemas para serem resolvidas pelas crianças e adolescentes. Autor do livro Mediação da aprendizagem - contribuições de Feurstein e de Vygotsky, em conjunto com a pedagoga e também psicóloga, Sandra Regina Rezende de Garcia, Meier é um dos divulgadores da Teoria da Mediação da Aprendizagem, do psicólogo romeno, residente em Israel desde 1944, Reuven Feurstein.
A Teoria defende principalmente que a inteligência pode ser desenvolvida e modificada ao longo da vida. Defende ainda que este desenvolvimento dependerá, principalmente, dos desafios a que o ser humano for submetido e tiver que suplantar e do ambiente ser ou não estimulador.
A medida deve ser aplicada a todas as situações, quando, por exemplo, os pequenos agridem física ou com palavras, um ao outro. O psicólogo explica que os pais e professores devem apoiar a criança para que ela mesma resolva a situação e não tomar a frente, empreendendo uma ação pessoal.
Se a criança optar por conversar com a professora ou outro adulto, pedindo que tome as providências para acabar com os insultos e agressões, tudo bem. O importante é que se sinta apoiada e que os pais e professores estão ali para ouvir a sua queixa e apoiá-la na busca pela melhor solução para o conflito. Mas, sempre será ela mesma quem deve resolver seus problemas, tornando-se independente e autônoma.
E acrescentou ainda que mais do que alfabetizar em letras e números, que é o papel da escola, os pais devem alfabetizar a criança emocionalmente. Fazer com que compreenda a diferença entre as emoções e os próprios sentimentos e os dos outros.
Todos precisamos de carinho
O psicólogo reforçou ainda a importância do afeto, do carinho, tanto para a criança quanto para o adolescente, o adulto e o idoso. Criança sem afeto, sem carinho, adoece. Já o adolescente, apesar de necessitar, morre de medo de alguém dar carinho em frente aos outros, especialmente os colegas.
A demonstração pública de afeto pelos pais e parentes é constrangedora para o adolescente, pois se sente tratado como criança. O carinho aos adolescentes, assim como as críticas, devem ser no ambiente privado.
Os elogios e críticas devem integrar o dia-a-dia da família e da escola. Os elogios devem ser em público, as críticas em particular, jamais pais e professores devem criticar, mesmo que sutilmente, na frente de colegas e/ou estranhos.
Os idosos que tem carinho também ficam menos doentes. "Todos nós precisamos de carinho, do contato físico", reforça Meier.
Cada filho é único
Entretanto, é importante ressaltar que cada pessoa deve ser tratada de modo especial, cada filho é único e deve ter o tratamento adequado a sua individualidade.
Nada de presentear o mais novo no dia do aniversário do mais velho ou vice-versa. A festa é do aniversariante, o outro filho, ou os demais, terão o seu momento especial.
E se todos somos diferentes, também o tratamento, os presentes e mesmo "o amor" dos pais deve ser na medida certa para cada um dos filhos e, no caso dos professores, dos alunos.
Negligência prejudica tanto quanto a superproteção
Incentivar que a criança e o adolescente resolvam seus próprios problemas, não é abandoná-los aos cuidados de si próprios, de empregados, de avós, de irmãos mais velhos, parentes ou vizinhos, de babás eletrônicas ou dos pais dos colegas. Ninguém tem obrigação de educar seu filho, no máximo, tem a obrigação de cuidar.
"Infelizmente os professores e pais negligentes nunca vêm às palestras ou fazem cursos. Eles acham que já sabem tudo. E normalmente deixam o filho no pior ambiente de aprendizagem, pobre em estímulos interativos e sem interatividade que pudesse promover a maturidade emocional de seus filhos, como é o caso da televisão. Negligenciam a formação, não valorizam a escola, o estudo e o trabalho e não sabem dizer NÃO aos filhos, ou seja, não educam", sentenciou.
Meier explicou que a negligência é tão prejudicial quanto a superproteção e que é preciso alfabetizar a criança emocionalmente, fazendo com que compreenda a diferença entre os sentimentos, para após compreender os próprios sentimentos, reconhecerá os do outro e será solidário, amigo.
Autonomia é construída ao longo da vida
A escola deve construir o cidadão, desenvolver a autonomia do seu aluno todos os dias. “Não adianta pensar em autonomia, em cidadania lá no final do processo, pois a autonomia é construída, portanto, é preciso pensar no processo. Isso vale para as escolas e professores e para os pais”, alerta.
“Não adianta a escola ter discurso de desenvolvimento de autonomia, de cidadania, se a escola não tiver uma postura de desenvolvimento de autonomia no dia-a-dia, não vai ser no final do processo que o aluno vai ser autônomo. Isso tem que acontecer todos os dias. Não adianta a gente sonhar com cidadania e autonomia lá no final do processo.
E para acontecer, os professores precisam entender como desenvolver a autonomia de seu aluno. E isso não é fácil, porque o professor está acostumado a dizer, anotem, copiem e fiquem quietos. Na hora em que o aluno desenvolve a autonomia, ele questiona, é crítico e traz outras alternativas de desenvolvimento.
O aluno que desenvolve a autonomia é crítico, é questionador e trata de outras opções de conhecimento, que o professor às vezes não conhecem, ou dominam menos que o aluno. Um dos exemplos, é a informática, os alunos sabem muito mais do que os professores em informática, porque desenvolveram autonomia nesta área? “Porque não poderiam ter desenvolvido em Química, Matemática e em Língua Portuguesa? Porque a postura da escola não é de desenvolvimento de autonomia”, sentencia.
Ao mesmo tempo em que propõe que a escola tenha uma postura de desenvolvimento da autonomia dos estudantes em todas as áreas, fazendo com que o professor seja, progressivamente o mediador da aprendizagem, tornando-se, de certo modo, desnecessário -porque ensinou o aluno a aprender a aprender- Meier explica que cabe aos pais devem promover a autonomia emocional e psicológica de seus filhos.
Para desenvolver esta autonomia são necessárias três coisas: ajudar a criança a resolver problemas por conta própria, mas lembrar sempre que ajudar não é resolver por elas; levar a criança a suplantar ou conquistar desafios e a superar dificuldades. Porque se os pais adotarem a seguinte posição: 'Ah, filho, está muito difícil para você, deixa eu faço para você, fica mais fácil para você. Então, o filho não desenvolve a autonomia. A gente simplifica muito as coisas para nossos filhos e alunos”, enfatiza.
A palestra para os pais, Meier trabalhou em quatro focos: desenvolvimento da autonomia, da inteligência emocional e inteligência cognitiva e geral e o quarto, os valores. “Porque não adianta ser super inteligente e viver dentro de uma cadeia, porque usou erradamente a inteligência. Não dá para desenvolver a inteligência desconexa dos valores", explicou Meirer.
Desenvolvimento da Inteligência Emocional
Professores e pais devem auxiliar o filho a alcançar a maturação emocional levando a criança a aprender a adiar a satisfação do prazer e contribuindo para que desenvolva a resistência à frustração.
Entre as ações que contribuem para o desenvolvimento emocional, citou como exemplo, não substituir animais de estimação, brinquedos perdidos ou quebrados e ser exigente em relação aos trabalhos e tarefas, pois segundo o palestrante, estas são situações em que a criança aprenderá a lidar com a perda e responsabilizar-se pelos atos.
De outro modo, quando perder o avô, o pai ou a mãe, o emprego, a namorada ou o namorado, perderá também “o chão”.
"E como substituir um pai ou avô falecidos?", perguntou Marcos. Que acrescentou, que se a criança não aprender a ligar com pequenas perdas, quando a perda for grande, a pessoa-mesma quando adulta- não terá aprendido a ligar com a frustração. As pequenas perdas ajudam a preparar para as grandes e inevitáveis perdas que se tem ao longo da vida.
Em situações de perda, quando perdeu um campeonato ou não conquistou uma medalha, ou uma nota alta, os pais e professores devem apoiar, interagir amigavelmente, acolher o sentimento, a tristeza, sem tentar anular o sentimento, simplesmente aceitando e deixando a criança viver o momento. Superado o sentimento de perda e a frustração, a pessoa estará pronta para continuar a viver novas emoções e relações afetivas.