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Jornal da Educação

Entrevista - Jornal da Educação (Junho/2013)

Telas diminuem a capacidade de concentração

     Pesquisas recentes mostram que a exposição excessiva e crescente às telas de computadores, televisão e aparelhos eletrônicos está diminuindo nos jovens, adolescentes e crianças a capacidade de manter a atenção voluntária, essencial para aprender em sala de aula. 

 

      As relações interpessoais no mundo real e a comunicação verbal e escrita também  são dificultadas, exatamente pela perda da capacidade de concentração. E além disso, cada vez mais cedo, aparecem problemas posturais, nas articulações, visão e os distúrbios do sono devido a falta de atividade física e por causa dos movimentos repetitivos para manipular os equipamentos eletrônicos. Fatores que prejudicam não somente a aprendizagem, mas diminuem a capacidade de relacionar-se com o mundo real e comprometem e muito a qualidade de vida atual e futura desta geração permanentemente ligada às telas.

 

      Os neurocientistas estão muito preocupados com o tempo excessivo que as pessoas, especialmente os mais jovens, passam diante das telas. Pois, por terem movimento, luzes e som, atraem e desenvolvem muito a atenção involuntária. 

 

      Como consequência, a capacidade de manter a atenção voluntária, aquela necessária para a aprendizagem ou no trabalho, diminui geração após geração.

 

      A diminuição significativa na capacidade de organizar uma resposta verbal, elaborar uma narrativa e fazer e manter amizades que não sejam virtuais são outras das    consequências desta exposição excessiva às telas.

 

      A neuropsicóloga Patrícia Volpato orienta os pais para que não permitam exposição maior do que duas horas por dia, especialmente para os menores de seis ou sete anos.

 

      Patrícia explica que a atenção que temos diante de uma tela de computador, TV ou do celular é involuntária e automática. Na sala de aula, precisamos é da atenção voluntária. 

 

      O estudante precisa focar a atenção no professor, na explicação, elaborar o raciocínio, se concentrar no livro para compreender a explicação e fazer o exercício. E é exatamente esta a capacidade que está sendo diminuída pela exposição excessiva às telas.

 

Pais devem disciplinar

 

      “Pensa no professor em sala de aula... Ele terá de lidar com a diminuição  da    capacidade de atenção voluntária nos alunos. E, ao mesmo tempo, usar as telas como alternativas para conseguir a   atenção       involuntária, que não é suficiente para consolidar a aprendizagem”, explica.

 

      “Os pais precisam ajudar estabelecendo horário e disciplinando os filhos. Em primeiro lugar, limitando o tempo de exposição dos filhos às telas”, afirma.

 

       “Outro dia, eu estava num restaurante e observei uma família no carro aguardando o pedido. O pai estava no celular, a mãe do lado, noutro celular e o filho, no banco traseio, também no próprio celular. Ou seja,  estavam juntos, provavelmente indo para casa após um dia de trabalho, mas cada um interagindo com sua tela individualmente. Não havia interação entre eles. E  aquele deveria ser um momento de conversa, de saber do dia um do outro, de ficar  juntos e curtir a companhia dos familiares ”, critica.

 

      Cada vez mais, a tecnologia carrega a humanidade para a frente das telas. Já o desenvolvimento das habilidades básicas necessárias, e não somente à aprendizagem, mas à vida em sociedade,  estão regredindo.

 

      Por outro lado, em decorrência da falta de atividades físicas e da exposição excessiva, cada vez mais cedo, crianças e adolescentes são acometidos por problemas de postura, de articulação e de visão.

 

     “Os jogos ajudam a desenvolver a capacidade de planejamento mental, raciocínio lógico e a linguagem, especialmente a leitura. No entanto, em boa parte das vezes, o adolescente consegue ler, mas não interpreta e não consegue elaborar e escrever uma resposta mais longa e consistente”, explica a especialista. 

 

      E sentencia, “o dedo para desligar o botão do computador, do celular, do tablet, da TV é o da mãe ou do pai. Mas não basta desligar. É preciso negociar com a criança que, para ter as duas horas no computador, tem que ter feito todas as atividades previamente combinadas, como tarefas escolares, brincadeiras de interação com outras criança, ler, etc”, orienta a psicóloga.

 

       “Cabe aos pais colocar as regras, estabelecendo um tempo para cada atividade do filho, porque é preferível chorar agora e não chorar depois”, alerta. Entretanto, se chego em casa e vou para o Facebook e deixo minha criança brincando sozinha, este é o modelo que ela vai seguir. Aliás, esta é uma queixa de muitas crianças que vem ao consultório”, completa.

 

      E continua: “Às vezes a gente não se percebe diante da situação. Mas tudo tem que ter o seu equilíbrio. Os pais é que tem que perceber pois, tanto à criança, quanto ao adolescente, falta a capacidade de controlar o tempo no computador.”, enfatiza Patrícia.

 

      “Os pais deveriam se perguntar: como desejo ver meu filho daqui a alguns anos? Quero que seja alguém preparado, que consegue lidar com essas experiências que não são virtuais? Pois tudo tem que ter um limite e esse limite cabe somente aos pais estabelecer. É difícil, com certeza, pois vou ver o resultado, somente daqui a algum tempo, mas é necessário”, enfatiza.

 

      O uso abusivo da tecnologia está afetando não somente a capacidade de concentração, mas também os relacionamentos e a saúde das crianças, adolescentes e jovens.  Há famílias que estão no mesmo ambiente físico, mas não estão juntas. Cada um permanece em seu próprio mundo virtual.   

 

Agitação e TDAH

  

      Além da diminuição da capacidade de prestar atenção, a exposição às telas após as 19 horas, prejudica o sono. O cérebro estimulado e a excitação dos jogos e filmes (mesmo os desenhos animados de lutas, por exemplo) provocam ansiedade.

 

      O desejo de passar de fase no jogo, por exemplo, ou continuar uma conversa na rede social, não possibilitará um sono tranquilo, necessário à consolidação da aprendizagem. E não raro, o indivíduo sequer consegue dormir ou tem insônia, acordando diversas vezes na noite.

 

       O sono desempenha papel primordial na qualidade de vida dos indivíduos, possibilitando não somente o repouso corporal, mas preparando a mente para os desafios que estão por vir. É durante o sono que os neurônios formam as redes que vão estabelecer as conexões entre os conhecimentos recebidos durante o dia. É no sono REM, o sono profundo, que o aprendizado é consolido.

 

      Se o estudante estudar um conteúdo na sala de aula e for privado do sono à noite, não haverá tempo para o cérebro consolidar essa aprendizagem e preparar-se para o aprendizado do dia seguinte.

 

      É à noite que os hormônios do crescimento atuam. A cicatrização da pele e de machucados são algumas das ações deste hormônio durante o sono. Por esta razão, as atividades físicas devem ser feitas durante o dia ou antes das 19 horas.

 

       É importante estabelecer uma rotina para o sono. O ideal é a criança, por volta das 19 horas, tomar um banho, vestir seu pijama e relaxar. Após o banho, somente atividades leves, como pintar, ler, jogar um jogo de tabuleiro com os pais ou assistir a um filme calmo. E, por volta das 21 horas, é hora de dormir.

 

     As crianças que estudam à tarde, muitas vezes, passam a manhã jogando e à tarde vão para a escola pensando no jogo. Este é mais um complicador para a aprendizagem.

 

     Para aqueles que estudam à tarde, é essencial disciplinar o horário de acordar, de praticar algum esporte pela manhã e de fazer as atividades escolares. 

  

Morte dos neurônios

 

     Uma pesquisa envolvendo dois grupos de jovens com a mesma capacidade intelectual comprovou o prejuízo da privação de sono.

 

      Ao final de uma semana, o grupo que teve sono regrado consegui aprender e fixar os novos conteúdos. O grupo que foi privado do sono, não aprendeu.

 

      A mesma pesquisa mostrou também que a privação do sono por longo período provoca a morte de neurônios.  “A plasticidade dos neurônios é muito estudada hoje. Por volta dos dois anos de vida, há uma perda neuronal.

 

      A fase de zero aos dois anos é quando começam a se abrir as janelinhas da aprendizagem. Aqueles neurônios que não foram estimulados e não formaram as redes são perdidos. No bebê muito novinho essas redes são muito maleáveis, por isso os bebês se adaptam facilmente às situações”, explica a neuropsicóloga

 

      Na adolescência acontece outra perda neuronal. Por volta dos 16 anos, as redes neuronais pouco usadas são perdidas, é a chamada poda sináptica. Ao manter-se exposto às telas e deixar de desenvolver outras habilidades, o adolescente está deixando inativa parte de seus neurônios. 

 

      A solução, portanto, está com os pais. O adulto não conseguirá trabalhar se não tiver a capacidade de atenção voluntária desenvolvida. 

 

Necessidade de rotina

 

      A diminuição da atenção voluntária pode levar a um diagnóstico errado de Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade-TDAH.  A neurologista pediátrica, Luana G. Dalla Rosa explica que o problema pode estar na química cerebral, mas que a maioria dos casos tem no fator social, a principal causa.

 

      A criança que vive num meio mais agitado, tem mais chance de ser agitada e ser diagnosticada com algum tipo de distúrbio ou transtorno. O Transtorno Opositor Desafiador é um exemplo de distúrbio que pode interferir diretamente na aprendizagem.

 

     Os prematuros, o uso de drogas lícitas e ilícitas pela mãe durante a gestação e a rotina agitada são apontadas como possíveis causas.

 

      “Entre os prematuros, o número de casos de hiperatividade são muito maiores. Não se sabe o motivo. Acredita-se que o meio interfira”, alerta a médica.

 

      “As famílias mudaram os hábitos. Há alguns anos, as mães tinham uma rotina voltada aos filhos. Hoje, a maioria das crianças tem a rotina em função das atividades das mães, em sua grande maioria profissionais que trabalham o dia inteiro. Então, a criança fica ou  na casa de um ou de outro parente, ou na escola o dia todo.  No final do dia, ou já à noite, a mãe chega em casa,  após um dia de trabalho, e continua a rotina agitada, faz um relatório, lava, cozinha e a criança vive nesse meio”. Vivendo em meio a agitação, a criança será agitada também.

 

      “Para o hiperativo, a organização e a rotina são muito importantes. Ele precisa ter hora de jantar, a hora de dormir, de acordar, para brincar, para estudar, etc”, orienta a neurologista.

 

       Cada pessoa tem uma necessidade diferente de sono e a qualidade do sono vai interferir no humor e na aprendizagem. “O ambiente adequado ao sono também é relativo. Algumas pessoas conseguem dormir só se o quarto estiver complemente escuro. O ideal é um ambiente calmo, com luz apagada ou mínima, mas isso não funciona bem para algumas pessoas”, explica.

 

      A médica acrescenta ainda que o adolescente, em geral, tem uma necessidade maior de sono (de 8 a 12 ou até 14 horas por noite).

 

       “Quanto mais tarde for dormir pior, porque se tiver que acordar cedo para ir para à escola ficará sonolento, irritado, agressivo, terá enxaqueca, distúrbios do humor, dificuldade de concentração e de aprendizagem”, acrescenta Luana. Ficar em frente ao computador ou televisão antes de dormir aumenta a  ansiedade, e a excitação vai dificultar o sono.

 

Hiperatividade

 

      “O TDHA está muito vulgarizado. Mas é bom esclarecer que este aspecto isolado não contribui para um comportamento agitado. Estudos demonstram que o ambiente interfere no comportamento. Muitos pais vêm consultar porque o filho é muito agitado, mas não raro, são famílias que têm muita dificuldade para impor limites para a criança que vive num ambiente agitado e portanto, será agitada também”, sentencia.

 

       “O diagnóstico do TDAH é clínico. É preciso haver repetição de comportamento em pelo menos três ambientes diferentes, para ser caracterizado TDAH. Por esta razão, o profissional da saúde, neurologista ou psiquiatra, precisará trabalhar diretamente com a família e a escola, antes de finalizar o diagnóstico, completa.

 
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