Escrito por Agatha A. Rinaldi da Silva
Reforma trabalhista x professores
É notório que a reforma trabalhista foi publicada em meio a muitos debates e polêmicas, tendo entrado em vigor em novembro do ano passado (2017) mesmo sofrendo duras críticas de grande parte dos operadores de direito, os quais temiam eventuais repercussões da norma, sustentando em síntese, que diversas alterações prejudicariam sobremaneira os empregados brasileiros.
Em verdade, mesmo agora, depois da publicação da Lei 13.467/2017, ainda paira uma nuvem de incerteza sobre a legislação trabalhista. Em que pese a lei seja pontual, a sua clareza e aplicação no caso concreto vai muito além da interpretação autêntica (feita pelo legislador) e da literal (gramatical), fazendo-se necessária a analise lógica, sistemática e utilização de métodos teleológicos para se chegar a uma conclusão final.
Se faz necessário que se aguarde para que a norma se estabilize e os entendimentos se solidifiquem perante o Poder Judiciário, não só porque ainda estamos no ápice da liberação de normas jurídicas sobre a matéria (vide a Medida Provisória n. 808/2017), mas também diante da existência diversas alegações de inconstitucionalidade que já estão sendo levantadas.
De mais a mais, é sempre salutar lembrarmos que a interpretação dentre os magistrados (jurisprudencial) pode ser divergente, demandando tempo até que haja um consenso sobre as matérias tratadas.
Não obstante, é possível levantar posicionamentos teóricos e discorrer sobre as repercussões que já se destacaram no cenário nacional, como é o caso das demissões em massa perfectibilizadas por empresas como a instituição educacional Estácio, que pouco tempo depois da entrada em vigor da reforma trabalhista, mais especificamente em dezembro de 2017, anunciou a demissão de mais de 1.200 (mil e duzentos) professores com o intuito de fazer a recontratação por meio de contrato intermitente.
Por certo tal conduta não só surpreendeu a população, mas como também fomentou o questionamento sobre a existência de fraude por parte da referida empregadora. Tanto que o Ministério Público do Trabalho ajuizou uma Ação Civil Pública, conseguindo temporariamente uma liminar que obstava as rescisões.
Todavia, esta foi cassada pelo Desembargador José Geraldo da Fonseca do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região que entendeu, em suma, pela superioridade do art. 477-A da CLT e inexistência de prova quanto a alegada dispensa discriminatória (MS n. 0102348-54.2017.5.0000).
Em que pese a celeuma da Ação Civil Pública e do Mandado de Segurança supra tenham tomado outro enfoque devido, dentre outras coisas, a idade dos professores demitidos, ainda pende questionamento suscitado pela mídia sobre a possibilidade de demissão dos empregados para posterior contratação mediante um salário menor e jornada mais flexível como do trabalho intermitente.
Em verdade, estes tipos de contrato têm como base uma jornada variável organizada por horas de trabalho, com o pagamento tão somente destas, de modo que sua característica mais marcante é a prestação de serviços com alternância entre períodos de labor e inatividade com o pagamento a menor em comparação as jornadas anteriormente legalmente instituídas.
A grande diferença deste regime de trabalho para uma jornada de até 44 (quarenta e quatro) horas semanais ou mesmo da estipulação antiga de pagamento mediante horas aula, nas quais era possível quantificar o auferido pelo empregado por mês, é que no contrato de trabalho intermitente isto é inviável, uma vez que não há a obrigação de uma estipulação prévia com tanta antecedência.
Outrossim, há uma insegurança financeira por parte do empregado, com a demanda de trabalho sendo gerida exclusivamente pelo empregador, além da diminuição da remuneração paga como contraprestação dos serviços.
Pois bem.
O legislador, prevendo a possibilidade de adversidades, buscou incluir um período de ajuste de conduta, o que se denota pelo art. 452-G da Medida Provisória n. 808/2017, segundo o qual: “até 31 de dezembro de 2020, o empregado registrado por meio de contrato de trabalho por prazo indeterminado demitido não poderá prestar serviços para o mesmo empregador por meio de contrato de trabalho intermitente pelo prazo de dezoito meses, contado da data da demissão do empregado”.
Observa-se, portanto, que existia uma exceção legal para toda e qualquer dispensa (seja individual ou coletiva) no particular. Nestes casos, seria irrelevante o debate sobre a existência ou não de fraude, eis que a lei apresentava uma norma negativa de conduta, ou seja, as empresas não poderiam demitir os seus empregados e recontrata-los com a estipulação de jornada intermitente até 21.12.2020.
Todavia, com a perda da vigência da Medida Provisória supracitada já não mais subsiste a referida norma negativa de conduta, o que significa que inexiste temporal para os empregadores que desejarem aplicar o sistema de jornada intermitente.
Pertinente ressaltar que em meio ao debate, há aqueles que acreditam que mesmo com a queda da Medida Provisória ainda seria muito precipitado instituir este tipo de jornada diante da instabilidade jurídica que permeia o tema.
Sob outra ótica, não havendo limitações legais expressivas na atualidade e diante das normas de vigência e aplicação das leis no tempo, há aqueles que defendem não vislumbrar prejuízo substancial para os empregadores que optem por aplicar este tipo de jornada, desde que não se pautem de meios fraudulentos para tanto.
Isto porque, ainda que seja restabelecido o teor da norma do art. art. 452-G, esta somente teria exigibilidade após a sua publicação, não alcançando casos previamente estipulados e concluídos.
Concepções a parte, nos cabe atualmente, como interpretes do direito, aguardar e nos atentarmos ao caminho que será calçado pelo legislador e pela jurisprudência no particular.
Agatha A. Rinaldi da Silva, advogada inscrita na OAB/PR 63.250, juíza leiga da Comarca de Curitiba, pós-graduada em Direito Contemporâneo e também em Direito e Processo do Trabalho.