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Centro de Educação a Distância

Jornal da Educação

De onde vem (Edição Dezembro/2020)

DE PROFESSOR PARA PROFESSOR

Escrito por Leandro Villela de Azevedo

Assim como a maioria dos professor, Leandro trabalha no anonimato. Ao ser questionado sobre foto para ilustrar este texto, a resposta foi:

“Fotos minhas em aula? Não. Tenho até fotos de alunos e de atividades mas nunca, nesses anos todos, saí em uma foto dando aula (e só percebi isso agora que você perguntou).

 

Neste espaço, dando sequência aos relatos em homenagens ao Dia do Professor, o colunista professor Doutor Leandro Villela de Azevedo, coordenador da coluna “De Onde Vem?” relata sua experiência durante. 

Sou professor há 21 anos. Formado pela USP, com mestrado e doutorado pela USP. Já produzi coleções didáticas, sites educacionais, diversos blogs, canais no You Tube, entre outros. Sou articulista no Jornal de Educação há muitos e muitos anos.

Em teoria, em termos pessoais apenas, eu não deveria estar preocupado com o cenário em que vivemos, digo, com minha profissão e meu sustento. Afinal, alta experiência, alto conhecimento tecnológico e boa formação deveriam me deixar seguro, correto? Se fosse me preocupar seria apenas em termos ideológico com as demais pessoas, correto?

Mas o fato é que estou desesperado.

Nesses meses vi meus colegas professores do superior um a um serem demitidos por turmas inteiras sendo fechadas, demissões em massa ocorrendo, cursos sendo fechados. Vi meus alunos pouco a pouco sumindo das aulas online seja por desmotivação quando a carreira, quanto ao curso ou por falta de capacidade de pagar as mensalidades.

As turmas estão com cerca de 5 a 8 alunos (onde antes eram salas com 40). Minha experiência quase toda é na rede particular de SP e grande SP (Educação Básica), e vi levas inteiras de alunos que estudavam em escolas particulares mais baratas migrarem para as públicas. Os das escolas particulares caras, migrarem para as mais em conta, o total de salas irem diminuindo.

Até mesmo uma famosa empresa de consultoria educacional especializada em recolocação profissional de professores praticamente dizendo que não adiantava contratar os serviços deles, pois era uma época onde as vagas estavam sumindo.

Um dado importante é que as turmas que estão desaparecendo no ensino superior são as que vão (ou iriam) formar futuros professores.

Nesse novo país que estamos criando as vagas de professor são raras (o que faz sobrar professores sem emprego agora), mas ao mesmo tempo em médio prazo. A fuga dos profissionais ativos na área da educação (pois precisam sobreviver), aliada a fuga dos futuros profissionais de educação que nem vão se formar, vai gerar uma situação muito perigosa, a extrema escassez de professores daqui a 10 ou 20 anos.

Acontece que professor no Brasil nunca foi muito valorizado, sempre teve salários (na educação básica pelo menos) muito mais semelhante a profissões que não exigem ensino superior, do que àquelas que precisam de ensino superior. Sempre foi uma profissão que adotamos por amor e ideologia.

Agora, com uma boa parcela destes precisando migrar para outras áreas e aprendendo a sobreviver de outras formas, me digam, eles irão querer reentrar em sala de aula daqui a dez anos recebendo um terço do que estarão recebendo? E nas universidades? Quando, ao que parece, professores estiverem sendo contratados aos montes pois a grande oferta de empregos a professores vai gerar pessoas querendo seguir essa profissão, quando serão encontradas pessoas especializadas com mestrado e doutorado para assumirem esses cargos?

Então, em termos emocionais estou realmente muito preocupado com nosso país e com os rumos que nossa educação irá tomar. E isso ainda se soma a perseguição político ideológica que muitos de nós professores estamos sofrendo.

Talvez seja mais difícil para as pessoas de exatas perceberem isso, mas a situação está ficando grave. Como professor de história eu pessoalmente já fui “atacado” por pais pois em teoria estaria doutrinando os seus filhos ao comunismo.

Eu, que não sou comunista, nem petista, recebi essas acusações por aulas simples. Por exemplo, explicar que na 2ª Guerra Mundial Hitler e Stálin eram inimigos. Que a URSS era aliada dos Estados Unidos (contrariando vídeos de um certo guru do governo que afirma o contrário).

Uma mãe descendente de japoneses que jurava de pé junto que o Japão era aliado dos EUA na 2ª Guerra e que era o inimigo era a China comunista (e que eu mentia para a filha dela pois eu seria comunista como os chineses).

Professores de geografia atacados por mostrarem listas do IDH ou de mortalidade infantil dos países da América Latina (pois mostrar que a mortalidade infantil de Cuba e Estados Unidos são muito semelhantes seria uma mentira criada pelos professores comunistas).

Professores de ciências atacados por explicarem sistema reprodutor. Professores atacados por ensinarem que a terra gira ao redor do sol. Professores sendo questionados do por que não ensinam que os índios seriam os culpados do desmatamento. E esses são os casos mais famosos e atuais, mas tudo parece virar uma problematização que traga acusações aos professores.

Faz poucos dias tivemos uma discussão nas redes sociais sobre o uso dos pronomes neutros em português (prática que faz parte da essência da língua inglesa). Tenho certeza que em poucos meses algum professor de inglês ainda será atacado por algum fundamentalista por conta do pronome neutro na língua (que existe há uns 1000 anos).

Isso pode ter sido um pouco reduzido durante o período de pandemia é verdade, mas temo muito pela voltar feroz destas situações unidas ao cenário explicado anteriormente.

A culpa sempre é do professor, o professor sempre é o lado fraco da corrente, seja financeiramente, seja ideologicamente. Ao ponto de nosso ministro da educação falar em alto e bom tom que qualquer pessoa que consiga sobreviver de outra forma que não dando aulas que o faria, pois apenas quem não conseguisse fazer nenhuma outra coisa, seria professor.

O fato é que, provavelmente, nós professores tenhamos uma época das trevas pela frente.. E eu, como mestre e doutor em idade média posso afirmar .... é preciso muita inteligência e jogo de cintura para se sobreviver em épocas como essa.

A Idade Média nos trouxe o surgimento das universidades, dos sistemas bancários, muitos avanços arquitetônicos, de siderurgia, de maquinários complexos, da música, entre outros, mas também jogou muito peso nas costas de cientistas e professores para que pudessem se adaptar a outras situações.

O que eu espero do futuro da educação no país? Confesso que não sei o que irá acontecer. Confesso que tenho sonhos e devaneios que sei que são impossíveis...

Então, de forma realista, diria que o que eu espero é que sobrevivamos a essa época para que, a exemplo da Idade Média, possamos ressurgir dessas épocas difíceis assim como foi o ressurgimento após a peste negra... E... que possamos entrar em uma era a estilo do renascimento ou era das luzes, primavera dos povos, etc após essa fase ruim passar.

 
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