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Notícia

23/05/2013-18h48

Professor da Udesc Laguna participa de gravação da BBC sobre interação entre botos e pescadores

Daura Jorge (com tarrafa) é filmado pela BBC - Fotos: Rodrigo Brüning Schmitt/Ascom Udesc

O curso de Engenharia de Pesca, oferecido pela Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) em Laguna, acompanhou na última semana os trabalhos da emissora britânica de televisão BBC no Canal da Lagoa de Santo Antônio dos Anjos, onde foram gravadas imagens da interação entre pescadores artesanais e golfinhos, conhecidos como botos-da-tainha na região.

Durante dois dias, o professor da Udesc Laguna Fábio Daura Jorge, que estuda o comportamento dessa espécie de botos no município desde 2006, auxiliou as filmagens e foi entrevistado sobre os projetos que desenvolve na universidade para pesquisar a chamada "pesca cooperativa".

"A equipe da BBC, que veio com oito pessoas, achou a interação fantástica e ficou completamente fascinada, apesar de não conseguir ver o ápice dessa relação entre botos e humanos devido às condições climáticas, que não estavam muito favoráveis", ressalta Daura Jorge. "Mesmo assim, eles saíram bem satisfeitos e demonstraram interesse por todos os detalhes."

Trechos do material gravado estarão em uma edição do programa "Planet Earth" (Planeta Terra), que será transmitida partir de outubro em um dos canais da emissora, o BBC One.

A BBC já filmou a pesca cooperativa de Laguna em 2009, quando fez gravações para o documentário "Human Planet" (Planeta Humano), que abordou diversas interações entre pessoas e animais ao redor do mundo.

Cooperação única no mundo

De acordo com o docente da Udesc Laguna, existem interações com a mesma espécie de botos no Rio Grande do Sul e com outras espécies na Mauritânia (África) e no Mianmar (Ásia), mas nenhuma delas se compara à de Santa Catarina. "Pelo número de botos e de pescadores, a interação de Laguna é mais intensa e interessante", afirma.

Os 53 golfinhos do Complexo Lagunar do Sul de SC, que é formado também pelas lagoas de Imaruí e Mirim, vivem separados em dois módulos (grupos) e o menor, com 20 membros, coopera com os pescadores, inclusive com a participação dos filhotes.

Segundo Daura Jorge, o comportamento do boto indica o momento de se jogar a tarrafa, o que garante ao pescador mais capturas de peixes e sugere benefícios também para os botos. A pesca ocorre o ano inteiro, porém, a interação é maior quando as tainhas aparecem.

O professor estima que a cooperação exista há, no mínimo, cem anos, mas faltam registros históricos que informem as datas com precisão. Para preencher essa lacuna, ele criou o projeto de extensão Tarrafa do Saber, no qual dois alunos de Engenharia de Pesca começaram a levantar dados desde março.


Colaborador estrangeiro

Além da BBC, o professor Daura Jorge recepcionou neste mês o pesquisador Simon Ingram, que atua na Universidade de Plymouth, a nona maior do Reino Unido, e obteve o seu doutorado com uma tese sobre a conservação da mesma espécie de golfinho (Tursiops truncatus) no Estuário de Shannon, na Irlanda.

O docente e o visitante se reuniram para estruturar experimentos que serão feitos no município catarinense em 2014, além de analisar detalhes de uma possível parceria institucional entre as universidades.

Esses experimentos ajudarão a alcançar os objetivos das três propostas de pesquisa desenvolvidas no curso de Engenharia de Pesca da Udesc Laguna.

Pesquisas

Formado em Ciências Biológicas e mestre em Zoologia com trabalhos sobre o boto-cinza (Sotalia guianensis), Daura Jorge passou a pesquisar sobre o boto-da-tainha no doutorado, também em Zoologia, realizado na Universidade Federal do Paraná (UFPR) e com período sanduíche na Universidade de Plymouth.

O professor explica que trocou de espécie por se interessar pelos estudos feitos anteriormente em Laguna por seu orientador na carreira acadêmica, o professor Paulo Simões Lopes, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

A tese de Daura Jorge foi defendida em 2011, com abordagens sobre os múltiplos aspectos ecológicos da população do boto-da-tainha em Laguna e suas implicações para conservação.

Após ingressar na Udesc no ano passado, ele continuou os estudos do doutorado com a criação de um projeto "guarda-chuva", com três propostas de pesquisa para saber como exatamente surgiu e funciona a pesca cooperativa, como os botos se beneficiam disso e como preservar a espécie.

Todas as propostas serão desenvolvidas no Laboratório de Ecologia e Zoologia, por uma equipe formada por sete professores, sendo três do curso de Engenharia de Pesca da Udesc Laguna e quatro colaboradores de universidades nacionais e estrangeiras.

Os estudos também envolvem oito alunos de graduação de Engenharia de Pesca e dois pós-graduandos de instituições de outros estados.

Com previsão inicial de serem realizadas até 2016, essas propostas também contam com recursos externos: R$ 79 mil pela Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado (Fapesc); R$ 40 mil por meio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq); e R$ 21 mil com a Fundação O Boticário de Proteção à Natureza.

Os valores estão sendo utilizados para a aquisição de equipamentos, como um quadricóptero para filmagem aérea, câmeras subaquáticas, hidrofones, máquinas fotográficas e sonda para batimetria, além de peças e acessórios para a embarcação Ceres I, da Udesc Laguna.

Metas

Com essa estrutura, o projeto "guarda-chuva" já iniciou os trabalhos de alguns objetivos, sendo um deles o monitoramento dos parâmetros populacionais dos botos, que fornecerá estatísticas para calcular o número exato de indivíduos e as taxas de nascimento e mortalidade.

O segundo objetivo, um monitoramento de praia para o resgate de carcaças de animais mortos, que inclui outras espécies de mamíferos marinhos, está sendo coordenado pelo professor da Udesc Laguna Pedro Castilho em um trecho de mais de 200 quilômetros do litoral, que vai de Imbituba até as proximidades de Passo de Torres, na divisa com o RS.

Outra meta, que inicia neste mês, é a criação de um banco de amostras biológicas para estudar a composição genética dos botos e a presença de contaminantes, análises a cargo da docente Karim Hahn Lüchmann, também da Udesc Laguna.

Os demais objetivos estão em fase de planejamento e começarão a ser executados entre o segundo semestre deste ano e maio de 2014, quando haverá a nova pesca da tainha.

Em uma dessas metas, o professor Daura Jorge pretende elaborar um modelo matemático para explicar a cooperação entre pescadores e botos pela Teoria dos Jogos Estratégicos, tendo apoio do docente Luke Rendell, da Universidade de St Andrews, uma das mais tradicionais do Reino Unido.

O professor quer ainda medir o grau de benefício da interação para os botos e estabelecer os valores socioeconômicos que a comunidade obtém com a pesca cooperativa.

Mortalidade alta e conservação

No médio prazo, os dados levantados ajudarão a definir com mais precisão a situação da população de botos-da-tainha residente no Complexo Lagunar do Sul de SC.

Daura Jorge diz que a população na região está estável. Considerada cosmopolita e encontrada em ambientes costeiros e oceânicos do mundo inteiro, a espécie vive em grupos com 50 a 100 indivíduos, que podem chegar, em média, até os 50 anos.

"O que me preocupa é que os botos de Laguna têm uma mortalidade muito alta e muitos indivíduos estão aparecendo com uma micose de pele aparentemente muito agressiva, a lobomicose", salienta, dizendo que o fungo geralmente se manifesta em um sistema imunológico deprimido.

Em 2009, o professor calculou a presença da doença em 12% da população dos golfinhos, mas acredita que o índice atualmente seja maior – para estabelecer um novo percentual, ele fará coletas de material durante os próximos meses.

O número de quatro mortes em 2013 também assusta, pois essa marca nunca foi registrada em anos anteriores pelo docente, que não sabe ainda os motivos exatos.

Entre as hipóteses levantadas, estão o movimento intenso e desordenado de embarcações, a utilização de algumas artes de pesca ilegais, as alterações de habitats e a poluição por atividades como mineração, rizicultura e suinocultura, que vem de rios da região e desagua no mar por meio do Canal da Lagoa de Santo Antônio dos Anjos. "Todo o fluxo do complexo lagunar passa por esse canal, é um ponto crítico", comenta Daura Jorge. 

Embora o local esteja adjacente à Área de Proteção Ambiental (APA) da Baleia Franca, a única proteção efetiva dos botos no momento é uma lei municipal que os tornou patrimônio de Laguna.

As pesquisas desenvolvidas pelo curso de Engenharia de Pesca da Udesc poderão reforçar a importância da espécie para a comunidade, assim como de novas medidas para conservá-la.

Assessoria de Comunicação da Udesc
Jornalista Rodrigo Brüning Schmitt
E-mail: rodrigo.schmitt@udesc.br
Telefones: (48) 3321-8142/8143
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